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Cap 9 Nova propriedade
Cap 9 Nova propriedade

 

     Não se completavam oito dias do meu retorno à casa grande, quando numa manhã, antes que Zezinho terminasse a tiragem do leite, padrinho João desesperado com a seca, e a ração estocada se acabando, chamou madrinha Guilhermina.

  • Guilhermina - disse ele - eu vou trocar de roupas. Vou apanhar o misto (caminhão de cabina dupla) que passará daqui a pouco na estrada de Campestre à Natal, e salto em Macaíba, onde eu tenho um amigo dono de terras com quem arranjarei um cavalo e irei a um povoado chamado Vera Cruz, a fim de comprar um sítio que estar para vender. Temos aquelas economias guardadas no fundo do baú que darão para comprá-lo. É uma região de agreste com água e pasto para os animais. Você coloque duas parelhas de roupa, escova de dente, pasta dental, sabonete e meu par de alpargatas dentro daquela minha mala grande de viagem.
  • E você vai tão ligeiro assim, João? - perguntou espantada madrinha Guilhermina.
  • Eu vou agora mesmo, Guilhermina, antes que seja tarde demais - respondeu.

Padriho João tinha aquela mania de anunciar uma viagem  nos últimos instantes.

Pela altura do sol, não passava das 7 horas. Vindo de bem distante, ouvia-se a gaiata do caminhão misto, a qual soltava algumas notas musicais da canção Asa Branca, do cantor e compositor Luiz Gonzaga.

Ao ouvir o cantar da gaiata, padrinho João Horácio apavorou-se,  gritando:

“Guilhermina, me dê logo essa mala, senão eu vou perder o carro!! Ele já vem cantando”.

Madrinha Guilhermina correu levando a mala. Ele montou-se no cavalo relâmpago, de sua monta  preferida, saindo galopando até à estrada, comigo na garupa para  levar o animal de volta. Foram dois quilômetros vencidos velozmente. Relâmpago não dava trégua à moleza. O carro já era visto numa reta da estrada de barro vermelho, deixando  um imenso corredor de poeira.

Chegou o veículo. Apanhou-o.

Estava lotado!

E   eu retornei à  casa grande.

Agora, o cavalo caminhava lento. Não o fiz galopear.

Eu olhava aquele deserto desolado, que assustava um povo desvalido e  sem nenhuma esperança de chuva. Ou nenhum sinal dela. Caminhei devagar. Parecia que eu estava num mundo desconhecido distante de tudo e de todos. Parecia estar divagando. Fui observando as queimadas feitas com rumas de  xiquexique  para alimentar  o  gado  faminto; e dele, porém, até o povo comia aquele talo duro,  seco e sem gosto, para saciar a fome dos adultos e crianças cadavéricos que temiam que a morrinha do gado lhes atingisse também.

Dezenas de ossadas de animais formavam uma ornamentação horrorosa no chão varrido pelo vento, deixando a população desvairada. Era um contraste que deixava em pavorosa a propria natureza.

Continuei observando!...

Fui observando e lá se vinha o vento forte formando redemoinhos tempestuosos, que passavam se contorcendo e fazendo ziguezague, feitos uma minhoca na areia quente, levando consigo o resto que a seca  havia destruído.   

Parecia que tudo aquilo era puro e simplesmente um devaneio, se não fosse tão real.

Tão real quanto o era a fé daquele povo na imagem de São José. Que não deu ouvidos ao clamor do povo.

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