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Capí 12 Na fazenda Pitombeira
Capí 12 Na fazenda Pitombeira

 

Luiz, filho de compadre Zeca, que era afilhado do meu padrinho João Horário, foi me ajudar nas obrigações diárias. A rotina, porém, em nada mudou. Padrinho João Horácio chamou Zeca, ao qual ordenou:

  • Compadre, amanhã, às 4 horas da madrugada, você venha aqui para ir com Júlio à Vera Cruz, que é para ele aprender o caminho e ir só.
  • Mas, esse menino? Ele vai sozinho!?
  • Sim, esse mesmo. Tem alguma coisa errada, compadre?
  • Não, meu compadre. Claro que não! Mas, é uma légua de distância e Júlio é uma criança!
  • È não, meu compadre; Júlio já é um homem. Não troco ele por certos homens.

Zeca, que aprendera com o seu compadre João Horácio a chegar antes da hora, levantou-se às três e meia e foi ao cercado apanhar a égua malhada e o jumento roxinho. Colocou as cangalhas e quatro barris nos animais, e foi até à porta da casa de padrinho João.

  • Compadre!... Compadre!... Compadre!... É Zeca. Estar na hora.
  • Já vou, compadre. Júlio!... - emendou meu padrinho aos gritos.
  • Inhô, padim!... Gritei já pulando da rede.

Desarmei minha rede e calcei as alpargatas de rabicho. Padrinho João, que já se encontrava na sala,  conversava com Zeca enquanto acendia um candeeiro grande feito de zinco e pavio  grosso de algodão. Aproximei-me dos dois.

  • Minha benção, padim!...
  • Deus lhe faça feliz, meu filho.
  • Podemos ir, compadre? - perguntou Zeca.
  • Claro, compadre. Pode! Vão com Deus.
  • Amém!! – respondeu Zeca.

Zeca montou-se no meio da carga da égua, e eu na do  jumento. E seguimos dentro da mata, por uma vereda estreita chega os ramos do mato roçavam nos barris. Zeca não dava uma palavra.  Não tardou, todavia, ouvirmos o cantar horroroso das corujas e o uivar das raposas, que não paravam de marcar presença,  passando sem parar de um lado para outro. A mãe-da-lua também marcou presença, porém, não se atrevendo como os dois últimos e preferiu ficar  de longe, com o seu arrastado cântico.

A barra ia quebrando, quando chegamos ao povoado de Vera Cruz. Seguimos a sua rua principal. Zeca entrou numa vereda, que lateralmente se limitava por duas cercas de arame farpado. Bem no pé de uma mata fechada e escura de arrepiar existia um grande poço com bastante água de vertente.

“É aqui” - disse Zeca.

Zeca saltou do animal. Aproximou-se do jumento querendo me tirar do meio da carga, mas pulei para a garupa do burro, e mais rapidamente para o chão, o qual nem me tocou. Cada um tirou os seus barris;  Zeca com um funil e uma lata os encheu. Depois, com a minha ajuda, colocou-os nos animais. Foi tudo muito rádido!

Andando mais lento, retornamos. O clima era gostoso diferente daquele que estorricava qualquer vida no sertão. Com aquele aroma suave que fluía das flores dos cajueiros, das mangueiras e outras árvores nos dava uma sensação de bem-estar, num convívio tranqüilo, que nos proporcionava a natureza.

Ouvimos o  sinal de que nos aproximávamos da casa de meu padrinho; foi o mugido da vaca asa branca no curral da casa grande, que todos as madrugadas, exatamente ao quebrar da barra, dava de dois ou três mugidos. Coisa de vaca!...

“Chegamos”! – disse Zeca.

Descarregamos os barris. Retiramos as cangalhas dos animais. E fui deixá-los no cercado de pastagem que ficava pertinho.

Padrinho João começara a tirar o leite das vacas, entretanto, não era bom tirador  diante do seu compadre Zeca; este foi ao curral feito de catanduba e mourão de pau d’arco, que substituía os de mororó do sertão, e assumiu o seu lugar de tirador-mor, enquanto padrinho João deixava o seu lugar-tenente.

Na casa de farinha à manual, chegavam os forneiro, prenseiro, moedores, tiradeira de goma,  raspadeiras de mandioca, peneradeira de massa e secadeira de crueira e goma.    Bem perto dali, num imenso roçado, os arrancadores de mandioca davam início ao seu trabalho.

Eu e Luiz de compadre Zeca fomos ao cercado. Encabrestamos quatro jumentos, nos quais colocamos cangalhas e caçoais. Pronto! Os animais estavam equipados.

 Nossa tarefa, a partir daquele dia, além das de rotina, era carregar mandioca para a casa de farinha no lombo dos animais.

Perto de uma hora da tarde a tarefa daquela manhã somava dez carregamentos. As raspadeiras, esparramadas ao redor daquela grande ruma de mandioca, não davam vencimento.

Escutei um grito:

“Ô,  Jú...li...o!!...”

Era padrinho João. Ele só me chamava arrastando as sílabas. Mas eu nem gritava respondendo. Eu saia calado. E se estivesse longe, saia correndo. E ele gritando:

“Ô,   Jú...li...o!!...”

Sai correndo da casa de farinha, e sem responder - como sempre. E ele gritando:

“Ô,  Jú...li...o!!..."

E  eu já por trás dele e bem pertinho, respondi:

“Inhô, pa...dim!!...”

Assustei-o! Virou-se para mim com uma cara de quem não gostara. Desculpei-me.

  • Foi sem querer, padim!
  • Meu filho, quando eu lhe chamar, você me responda! Vá ao roçado e diga ao compadre Zeca que traga os trabalhadores para o almoço.
  • Sim, sinhô, padim.

Àquela hora, Antônio forneiro - como o era conhecido Antônio de  Chico Guedes - preparava a sua quarta fornalha de farinha de primeira qualidade, que ia sendo armazenada em grandes sacas de palha de carnaúba, guardadas num dos imemsos quartos da casa grande.

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